De pedreiro a doutor: perseverança é a palavra

A história de Rogério Marchiosi mostra que cada um pode mudar o próprio destino e escrever a sua trajetória profissional. Para custear as despesas da casa e dos estudos, ele voltou ao canteiro de obras. Valeu a pena

Fonte: O Diário de Mparinga/PR

Quem o vê folhear livros e envolvido em atividades da carreira acadêmica de uma das universidades mais importantes do Brasil, a Universidade Estadual de Maringá (UEM), nem imagina o árduo caminho que Rogério Marchiosi, 31, percorreu. De operário da construção civil, Marchiosi, por esforço próprio, alcançou o título de doutor em bioquímica. Na adolescência, o sol nas costas, enquanto batia massa de concreto em um canteiro de obras, não provocava desânimo, pelo contrário: ele se dedicava tanto que ao final da primeira casa que ajudou a construir, no Jardim São Jorge, em Maringá, já assentava tijolos com destreza de um profissional.

 

Perseverança e dedicação explicam como um ajudante de obras, depois pedreiro, chegou à titulação de doutor. Tudo começou quando, em 1997, a sua família se mudou de Guaianases, na grande São Paulo, onde ele viveu sua infância, para o Paraná.

 

Seu pai trabalhava em uma cervejaria que foi transferida para Jaguariúna, mas em pouco tempo veio a demissão. Mudaram-se todos para Maringá, cidade natal do patriarca da família. A construção civil, ofício do qual o pai já tinha experiência, se tornou a saída para suprir as necessidades da família. Foi então que Marchiosi decidiu acompanhá-lo.

 

Foram anos trabalhando em meio a obras até que chegasse ao fim o ensino médio. Nessa época, ele percebeu que seria necessário se matricular num curso pré-vestibular para ingressar na universidade.

 

"Saí com muitas deficiências do ensino médio, e isso representou um grande obstáculo que tive que transpor com muitas horas de estudo", diz. Ele deixou, então, o trabalho pesado de lado, porque não seria possível conciliar as duas atividades.

 

O garoto fez seu primeiro vestibular para medicina, apesar do desejo do pai de que se tornasse um engenheiro civil. Ele conseguiu apenas metade dos pontos necessários para o ingresso. No ano seguinte, decidiu disputar uma vaga do curso de ciências biológicas, e mergulhou de cabeça nos estudos para alcançar tal objetivo. Tanto esforço valeu a pena. Ele foi aprovado na 17ª colocação.

 

Sua vida como acadêmico teve início em 2002, mas as primeiras disciplinas não o animaram - renasceu a vontade de cursar medicina, mas por conselho do pai seguiu adiante, felizmente. Isso porque no segundo ano do curso, Marchiosi se deparou com a bioquímica, que lhe despertou paixão e foi o combustível para que continuasse os estudos.

 

A dedicação e o interesse do jovem, já perceptível na época da construção civil, fizeram com que ele procurasse um estágio, mesmo não remunerado. O que aprendeu nesta fase o estimulou a investir em educação continuada - foi então que se inscreveu num mestrado.

 

"Quando o professor perguntou para os alunos sobre seus sonhos, meus colegas de turma disseram que gostariam de trabalhar em grandes universidades americanas, europeias e até mesmo em multinacionais. Quando interrogado, eu respondi que meu sonho era ser professor efetivo do Departamento de Bioquímica da UEM", conta.

Sede de aprender

Ele não parou por aí. Movido pela sede de conhecimento, Marchiosi começou o doutorado, em julho de 2008 - em meio a muitas dificuldades. Não havia previsão de liberação de bolsas de estudo, ele não conseguiu emprego em faculdades privadas, e sua esposa, com quem se casara durante o mestrado, também estava desempregada.

 

Foi então que sua perseverança, mais uma vez, se sobressaiu. Para manter os estudos e custear os gastos da casa, Marchiosi voltou a trabalhar com o pai. "Como não podia deixar o doutorado de lado, procurei dividir o tempo trabalhando um dia na construção civil e outro no doutorado". Foram meses árduos, mas que o fortaleceram. Motivado a trabalhar em seu projeto, a bolsa de estudos veio em dezembro.

 

Depois, ele foi aprovado em um teste seletivo para docente da área, mas a vaga era para o campus da UEM em Umuarama. Não foi uma decisão fácil deixar a bolsa do projeto, mas a experiência era necessária.

 

Segundo ele, foram 60 mil quilômetros percorridos (entre idas e voltas) em um Monza 94. Os dois anos de contrato - quase intermináveis, por causa do desgaste, mas tão enriquecedores, chegaram ao fim em 2011.

 

Novamente o desemprego bateu à porta, mas depois de um tempo ele se inscreveu em outro processo seletivo, em 2012, e conquistou mais dois anos de emprego no Departamento de Bioquímica da UEM. "O emprego veio em boa hora, pois o nascimento do meu filho Miguel estava marcado para o final de março", relata.

 

Um concurso público aconteceria neste mesmo mês, mas como o pequeno Miguel nasceu uma semana antes da realização da prova, Marchiosi passou por uma prova de fogo em um dos períodos mais difíceis que teve que enfrentar. "Tive que me privar da presença do meu filho e da minha esposa para estudar".


 

Concorrendo com doutores e pós-doutores, o segundo lugar para o então mestre teve um gosto a mais de vitória. Mas como havia somente uma vaga, a esperança era de que uma nova fosse aberta. Enquanto a notícia, pela qual ele aguardava ansioso não vinha, um concurso para professor temporário no campus de Ivaiporã, no qual passou em primeiro lugar, garantiu mais um período de alívio financeiro. "Fui contratado em janeiro de 2014".

O sonho

Já doutor, Marchiosi, acompanhado da esposa e do filho, se mudou para Ivaiporã. Mas em abril, um novo fato fez com que retornasse para Maringá. Ele foi chamado para assumir o emprego com o qual tanto sonhou.

Surgiu a segunda vaga - daquele concurso prestado para professor no campus de Maringá. "Assinei meu contrato no dia 1º de maio de 2014 e estou trabalhando no Laboratório de Bioquímica de Plantas da UEM. Descobri que quando traçamos um objetivo, devemos lutar por ele até que o tenhamos alcançado. Acredito que nós somos do tamanho dos nossos sonhos", diz, sem esconder o orgulho.

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